
A Comissão de Comércio Internacional do Parlamento europeu aprovou nesta segunda-feira (9) mecanismos de salvaguarda para importações agrícolas vinculadas ao acordo UE-Mercosul, num movimento que pode eliminar o principal obstáculo para a conclusão do tratado comercial. A votação terminou com 27 votos favoráveis, 8 contrários e 7 abstenções.
O resultado representa mais do que uma simples aprovação: os deputados endureceram significativamente a proposta original que a própria Comissão Europeia havia apresentado em outubro. As mudanças visam acelerar e facilitar a implementação de medidas de proteção ao setor agrícola europeu, endereçando diretamente as preocupações de países como França e Polônia, que lideram a resistência ao acordo.
Gatilhos mais sensíveis e prazos mais curtos
A principal alteração diz respeito ao gatilho para abertura de investigações sobre a necessidade de proteções. Os deputados reduziram de 10% para 5% o aumento nas importações de produtos agrícolas sensíveis, como carne bovina ou de frango, que pode desencadear uma investigação. O cálculo é feito na média de três anos.
A mudança tem implicações práticas importantes: com um gatilho menor, as autoridades europeias poderão reagir mais rapidamente a aumentos nas importações do Mercosul. Na prática, isso significa que produtores europeus terão proteções acionadas mais facilmente caso sintam pressão competitiva de produtos brasileiros, argentinos, paraguaios ou uruguaios.
Os parlamentares também reduziram drasticamente os prazos de investigação. O período para apurar se há necessidade de salvaguardas caiu de seis para três meses em casos gerais, e de quatro para dois meses em produtos considerados sensíveis. A lógica é clara: acelerar a implementação de eventuais medidas de proteção, evitando que produtores europeus fiquem expostos por períodos prolongados enquanto aguardam decisões burocráticas.
Outra novidade aprovada pela comissão foi uma emenda estabelecendo que as salvaguardas podem assumir a forma de obrigações de reciprocidade. Na prática, isso significa que a UE poderá exigir que os países do Mercosul apliquem os mesmos padrões de produção europeus como condição para manter as preferências tarifárias.
A medida atende a uma demanda persistente de produtores europeus, que argumentam que competir com produtos sul-americanos é injusto porque eles não precisam cumprir as mesmas regras ambientais, sanitárias e trabalhistas impostas na Europa. A França, em particular, tem insistido nessas chamadas “cláusulas espelho”.
Um obstáculo a menos
As salvaguardas aprovadas representam uma tentativa de desarmar a principal crítica ao acordo UE-Mercosul: que ele exporia produtores europeus a uma concorrência desleal. Agricultores franceses e poloneses protestaram diversas vezes contra a negociação, argumentando que o acordo permitiria a entrada massiva de produtos brasileiros sem garantias adequadas de proteção.
Ao endurecer as proteções, o Parlamento europeu sinaliza que está disposto a avançar com o tratado, mas apenas com salvaguardas robustas. O objetivo é pavimentar o caminho para a ratificação final, que ainda enfrenta resistência significativa no Conselho Europeu, onde França e Polônia tentam formar uma minoria de bloqueio.
Para o Brasil, maior produtor agrícola do Mercosul e um dos principais beneficiários potenciais do acordo, as salvaguardas representam um preço a pagar pela conclusão do tratado. A União Europeia é o segundo maior destino das exportações do agro brasileiro, respondendo por 14% do total em 2024, atrás apenas da China (30%) e à frente dos Estados Unidos (7,3%).
O texto aprovado pela comissão será votado no plenário do Parlamento europeu na próxima semana. A expectativa é que o acordo UE-Mercosul seja assinado ainda em dezembro, durante a reunião da Cúpula dos Líderes do Mercosul em Foz do Iguaçu, com o Brasil na presidência rotativa do bloco.
A aprovação das salvaguardas não garante a ratificação final do acordo, que ainda precisa passar pelo Conselho Europeu e pelos parlamentos nacionais de alguns países. Mas remove um dos principais argumentos dos opositores ao tratado: a falta de proteções adequadas para o setor agrícola europeu. Se as salvaguardas conseguirem convencer os países céticos, um acordo comercial negociado desde 1999 finalmente poderá sair do papel.






