Noruega escolhe “azarão” para liderar seu megafundo na pandemia

16 de abril de 2020 4 minutos
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Aos 54 anos, o gestor de recursos norueguês Nicolai Tangen, fundador da AKO Capital, construiu em Londres sua boa reputação no mercado financeiro. Na atividade, ele conquistou uma fortuna que, em 2019, chegou a 5,5 bilhões de coroas (R$ 2,7 bilhões, em valores atuais), segundo estimativa da revista norueguesa de negócios Kapital. Com uma das trajetórias mais vencedoras do mundo das finanças de seu país natal, Tangen foi o escolhido para um desafio gigantesco: comandar o fundo soberano da Noruega em meio à crise econômica do coronavírus.

A despeito de seu prestígio no mercado financeiro, na disputa pelo cargo, Tangen pode ser considerado um azarão. Ele sequer estava entre os nomes cotados para substituir Yngve Slyngstad na liderança do fundo que administra as riquezas do petróleo do país e é o maior do gênero no mundo. Slyngstad, que preside o Norges Bank Investment Management – nome oficial do fundo – desde 2008, passará o bastão em setembro. Ele é considerado um dos grandes responsáveis por transformá-lo em um colosso das finanças internacionais.

O fundo soberano da Noruega encerrou 2019 com um patrimônio inédito de US$ 1,2 trilhão, mas o quadro mudou completamente com a crise do coronavírus. No início de abril, o fundo informou que teve um retorno de -14,6% nos primeiros três meses de 2020. Esse foi seu pior desempenho trimestral desde que ele foi criado, há 24 anos.

Na infância, dinheiro de venda de jornais virava investimento

Tangen não se abala. “Esse não é apenas meu emprego dos sonhos, ele é um sonho de infância“, disse ele no mês passado, como registra o jornal britânico Financial Times. O experimentado gestor de fortunas diz ter desenvolvido gosto por investimentos ao aplicar o dinheiro que ganhava trabalhando como vendedor de jornal e de flores e também reciclando garrafas depois de jogos de futebol.

Ao trocar seu comando, o fundo norueguês manterá uma característica bastante peculiar: a de ser liderado por alguém com talentos que vão além do mundo das finanças. O atual e o futuro presidente são igualmente reconhecidos por sua capacidade (e curiosidade) intelectual.

Yngve Slyngstad tem formação universitária em cinco diferentes áreas e um notório – e profundo – conhecimento sobre filosofia alemã. Nicolai Tangen, por sua vez, tem, além de sólida formação na área financeira, mestrados em história da arte e em psicologia social e é apontado como um dos maiores colecionadores de arte moderna nórdica do mundo. Suas credenciais incluem ainda treinamento em tradução e técnicas de interrogatório no Serviço de Inteligência Norueguês. E, como se ainda não fosse bastante, ele é considerado um excelente chef de cozinha.

Ele vai pagar para trabalhar – literalmente

Multimilionário que já é, Tangen certamente não aceitou o convite por causa do salário. Na verdade, ao se mudar de Londres para Oslo, ele acabará pagando muito mais ao fisco norueguês do que receberá como remuneração. Ao voltar a morar na Noruega, ele terá que recolher 70 milhões de coroas (R$ 35 milhões) para o imposto sobre fortunas. Em todo o ano passado, o salário de Slyngstad no comando do fundo foi de 6,7 milhões de coroas (R$ 3,3 milhões).

“Isso é admirável, mostra que Tangen é de fato um patriota”, disse ao Financial Times Timothy Warrington, CEO da gestora de recursos norueguesa Skagen Funds. A falta de recompensa financeira, diz Warrington, mostra o “compromisso real” de Tangen. E o novo presidente afirma que pagará o imposto “com prazer”.

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