Em poucas semanas a brutal guerra na Ucrânia mudou tudo na Finlândia.
Até fevereiro 2022, aproximadamente 80% dos seus habitantes acreditavam que a melhor opção para o país era não fazer parte da aliança militar do Ocidente, a OTAN. Até o Presidente da República, Sauli Niinistö, era cético em relação ao tema.
A invasão da Ucrânia, no entanto, mudou esse cenário e em maio de 2022 o Parlamento finlandês se posicionou pela entrada na OTAN. Apenas 7 dos 200 deputados votaram contra a adesão e em 4 de abril de 2023 a Finlândia tornou-se oficialmente membro da Aliança. Todos os partidos, da esquerda à direita, suportaram a decisão.
O que mudou em tão pouco tempo para todo o país trocar radicalmente de opinião? A resposta é simples: nós nos confrontamos com a realidade. Desde a Segunda Guerra Mundial a Finlândia havia adotado a posição de país neutro, se equilibrando entre as superpotências e os blocos capitalista e comunista. Como dizia Urho Kekkonen, presidente de 1956 a1982: “Não somos juízes, somos médicos”. Ele queria dizer que o objetivo do país não era julgar, mas sim facilitar a paz.
Esse esforço pela manutenção de uma posição independente fazia um sentido geopolítico: como a Finlândia fez parte do império russo de 1809 e 1917, um não-alinhamento parecia prudente em relação ao governo de Moscou, um vizinho com o qual o país possui uma enorme fronteira de 1.340 quilômetros de extensão.
Na Europa essa estratégia era interpretada de forma diferente daquela predominante na Finlândia. O continente considerava aquela opção política como uma submissão à então União Soviética. Ouvia-se repetidamente a palavra “finlandização” nas esferas da política internacional como um exemplo perigoso de país não independente de fato, mas sim uma espécie de satélite da União Soviética. Essa política provavelmente começou como um reconhecimento da situação política bipolarizada no mundo, mas com o tempo ganhou contornos bizarros: a televisão finlandesa, por exemplo, levava ao ar um programa chamado “15 Minutos no País Vizinho”, com notícias sobre a ditatura soviética sem nenhuma visão crítica.
O colapso do comunismo e a adesão da Finlândia à União Europeia nos anos 1990 mudaram a situação. Deixamos de ser um país totalmente neutro, ainda que não estivéssemos aliados militarmente ao Ocidente.
Mas, voltando à pergunta inicial: o que causou uma mudança de opinião no país em poucos meses? Seguindo a tradição de 70 anos de uma visão independente, pensávamos que era melhor ser médico do que juiz, e acreditávamos sermos um médico que conhecia bem seu paciente, a Rússia. No entanto, as mentiras do governo russo (apenas alguns dias antes da invasão da Ucrânia o presidente Vladimir Putin disse que Moscou não tinha qualquer intenção de atacar) mostraram que não conhecíamos o paciente. Éramos simplesmente ingênuos. Como disse o atual presidente Sauli Niinistö: “As máscaras caíram”.
A economia reage bem
A guerra gerou um impacto limitado na economia finlandesa, embora os juros e a inflação tenham subido e algumas empresas tenham ficado mais expostas devido a interrupção de negócios com o mercado vizinho. A atividade econômica no país tem reagido surpreendentemente bem, e o setor financeiro está em boas condições.
Antes da guerra, a Rússia representava o destino de apenas 4% das nossas exportações. Nos anos 1980 o número chegava a 20% e o colapso do comunismo causou na época a maior recessão econômica desde os anos 1930.
Em abril deste ano a Finlândia realizou eleições parlamentarias e venceu o Partido da Coligação Nacional, de direita moderado, seguido de perto pelo Partido dos Finlandeses, de viés nacionalista. Embora ambos partilhem as mesmas visões sobre as finanças do Estado (entendem que deve haver um rígido controle dos gastos) eles possuem visões muito diferentes quanto a imigração e a União Europeia. O Partido Nacionalista, por sinal, defende a saída do país do bloco europeu.
A formação de um novo governo é um desafio para o partido vencedor das eleições, pois os votos do eleitorado se dividiram bastante e a formação de uma coalisão não parece tão simples. O Partido da Coligação Nacional conseguiu 20,7% dos votos nas eleições de abril (48 cadeiras das 200 do Parlamento). Em segundo lugar ficou a sigla da direita populista e nacionalista representada pelo Partido dos Finlandeses com 20,1% das preferências (46 cadeiras) e na terceira posição ficou o Partido Social Democrata, de centro-esquerda, que vinha sendo liderado pela premiê Sanna Marin, que obteve 19,9% dos votos (43 cadeiras).