Europa flexibiliza metas para montadoras e reacende impasse entre transição verde e competitividade

15 de maio de 2025 4 minutos
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A União Europeia aprovou recentemente uma flexibilização significativa em sua política climática para o setor automotivo, sinalizando o momento delicado em que o continente se encontra: pressionado entre o compromisso de neutralidade de carbono e a necessidade de proteger sua indústria da perda de competitividade global.

O novo regulamento, já validado pelo Parlamento Europeu com 458 votos favoráveis, permite que as emissões médias de dióxido de carbono (CO₂) dos carros e vans vendidos entre 2025 e 2027 sejam calculadas com base em uma média de três anos, e não exclusivamente em 2025, como previa a legislação anterior.

O relaxamento das metas é, na prática, uma resposta direta aos apelos da indústria automotiva europeia, que alertava para um possível colapso econômico diante das sanções previstas para descumprimento. Estimativas da Associação Europeia de Fabricantes de Automóveis (ACEA) projetavam multas que poderiam ultrapassar €15 bilhões caso os fabricantes não conseguissem atingir a meta de 93,6 g de CO₂/km em 2025 — um corte de 15% em relação ao teto de 2021 (110 g/km) .

A indústria automobilística representa aproximadamente 7% do PIB da União Europeia e 8 milhões de empregos diretos e indiretos. Em países como Alemanha, França, Itália e Espanha, o setor tem peso estratégico e está no centro de disputas políticas internas e externas, diante da concorrência cada vez mais agressiva de montadoras chinesas como BYD e SAIC, além da norte-americana Tesla.

Um dos principais argumentos da indústria — e aceito por Bruxelas — é que a infraestrutura de recarga para veículos elétricos ainda está muito aquém do necessário. A meta da Comissão Europeia prevê 1 milhão de pontos de carregamento até 2025, mas o número atual está abaixo de 500 mil, segundo dados do European Alternative Fuels Observatory.

Além disso, a venda de veículos elétricos, embora em expansão, ainda representa apenas cerca de 14% do total de carros novos vendidos na UE, com variações consideráveis entre os países. Enquanto Noruega, Países Baixos e Suécia lideram a transformação, países do Leste Europeu ainda mostram adesão marginal à mobilidade elétrica.

Ambientalistas alertam para retrocesso climático

Grupos ambientais e eurodeputados da ala verde veem na decisão um recuo perigoso e uma quebra de confiança com o Acordo Verde Europeu (Green Deal). “A UE está perdendo autoridade moral e liderança global no combate às mudanças climáticas”, afirmou a eurodeputada Karima Delli, presidente da Comissão de Transportes e Turismo do Parlamento.

Para os críticos, a decisão cria um precedente arriscado: o de que metas climáticas podem ser renegociadas por pressão econômica. Eles lembram que o setor teve sete anos para se adaptar às regras definidas em 2018 e que ceder agora pode comprometer também outras metas futuras, como a proibição da venda de carros com motor a combustão até 2035.

Um problema de transição, não de intenção

A decisão da UE ilustra um paradoxo crescente: embora os países mantenham metas ambiciosas de descarbonização, a transição está sendo freada por gargalos estruturais — falta de investimento em infraestrutura, custos elevados para consumidores e ausência de políticas integradas entre transporte, energia e urbanismo.

Não se trata apenas de salvar a indústria automotiva, mas de repensar a arquitetura política da transição energética europeia. Até o momento, a estratégia de descarbonização tem se apoiado fortemente em metas regulatórias, mas carece de mecanismos mais sólidos de incentivo à inovação e à equidade social na adoção da nova mobilidade.

 

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