
O acordo de livre comércio EU-Mercosul pode criar um mercado potencial de mais de 700 milhões de consumidores, trazendo benefícios para indústrias e empresas de serviços dentro das regiões cobertas pelo acordo. Para os especialistas que discutiram o assunto no European Day, em Bruxelas, apesar dos desafios da integração, os resultados serão positivos para ambas as partes.
O debate contou com a presença de três especialistas com trajetórias relevantes no comércio internacional: Lucas Ferraz, ex-secretário de Comércio Exterior do Brasil e pesquisador da Fundação Getúlio Vargas; Stephen Wilkin, consultor de riscos e mercados emergentes; e Stefan Pinter, diretor de políticas públicas da Suzano, maior produtora de celulose de mercado do mundo.
Lucas Ferraz destacou a magnitude do tratado, que une economias com um PIB combinado de cerca de 22 trilhões de dólares e abrange um mercado consumidor de 720 milhões de pessoas. Ele ressaltou que a União Europeia é o segundo maior parceiro comercial do Brasil e explicou como a liberalização tarifária pode beneficiar os setores industrial e agrícola.
“Estimamos que este acordo tem o potencial de aumentar as exportações e importações do Brasil em mais de 200 bilhões de dólares em 15 anos, além de atrair cerca de 100 bilhões em novos investimentos”, afirmou Ferraz.
Além disso, o acordo deve estimular a integração da indústria brasileira às cadeias globais de valor, especialmente por meio do acesso a bens de capital e tecnologia europeus, contribuindo para a inovação e aumento de produtividade no setor industrial nacional.
Stephen Wilkin ofereceu uma visão complementar ao enfatizar os desafios enfrentados por empresas de ambos os blocos. Ele mencionou a complexidade das regulamentações ambientais e trabalhistas europeias, além das dificuldades de financiamento enfrentadas por empresas brasileiras ao ingressarem no mercado europeu.
“Há um desafio real em navegar pela complexidade regulatória da Europa. A exigência de conformidade com leis como a Lieferkettensorgfaltspflichtengesetz, por exemplo, pode ser um obstáculo significativo”, explicou Wilkin, referindo-se à lei alemã sobre responsabilidade na cadeia de suprimentos.
Do lado europeu, ele apontou que muitas empresas ainda enfrentam receios ao investir em um mercado vasto e diverso como o brasileiro, destacando a necessidade de compreensão local e adaptação cultural para ter sucesso.
Stefan Pinter compartilhou a experiência da Suzano na Europa, ressaltando a importância de estar presente e ativo nos diálogos regulatórios e institucionais no continente.
“Há muita desinformação sobre as empresas brasileiras na Europa. Por isso, é fundamental estarmos presentes e informarmos diretamente os formuladores de políticas sobre como operamos”, disse Pinter.
Apesar de o setor de celulose não ser impactado por tarifas no acordo, Pinter reforçou o valor estratégico da regulamentação europeia em temas como sustentabilidade e reflorestamento. Segundo ele, a Suzano consegue transformar exigências ambientais em vantagem competitiva ao provar a rastreabilidade e o caráter sustentável de suas operações.
Os três painelistas reforçaram o caráter estratégico do acordo para os dois blocos. Wilkin destacou a importância de se olhar além da burocracia e identificar oportunidades reais com base em parcerias sólidas. Pinter encorajou as empresas brasileiras a acreditarem no mercado europeu e adotarem uma abordagem integrada e de longo prazo. Já Ferraz alertou para a necessidade de a União Europeia ratificar o acordo o quanto antes:
“Se os europeus não avançarem com a internalização deste acordo, outros países ocuparão esse espaço estratégico, o que seria uma perda para as relações bilaterais”, concluiu.
O painel refletiu a complexidade e o potencial transformador do acordo UE-Mercosul, apontando caminhos para que empresas e governos de ambos os lados aproveitem ao máximo essa nova fase de cooperação econômica.