Discurso anti-imigração transcende ultradireita e molda nova política europeia

16 de outubro de 2024 3 minutos
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Nos últimos meses, o debate sobre imigração na Europa passou por uma transformação profunda, movido não apenas por partidos de extrema-direita, mas agora também por setores de centro-esquerda. A pauta, antes associada às margens políticas, se firmou no mainstream europeu, refletindo as crescentes preocupações da maioria dos cidadãos do bloco. Nesta semana, quando líderes da União Europeia se reúnem em Bruxelas para discutir novas diretrizes sobre migração, a retórica mais dura em relação a imigrantes ilegais deverá ganhar ainda mais força.

A principal justificativa para esse endurecimento, conforme evidenciado por documentos como o liderado por Áustria e Holanda, é a necessidade de acelerar deportações de imigrantes com pedidos de asilo negados. A pressão para uma mudança de paradigma na política de migração tem o apoio de grandes economias como França, Alemanha e Itália, o que indica que esse movimento está longe de ser isolado.

Esse cenário contrasta com a realidade dos números: houve uma queda de 39% na chegada de imigrantes ilegais ao bloco nos primeiros oito meses de 2024. Ainda assim, a percepção da imigração como causa de problemas sociais, como desemprego e insegurança, segue dominando o discurso público, principalmente em países que vivenciam uma rápida transformação demográfica.

O envelhecimento da população europeia e a chegada de estrangeiros de diferentes culturas e religiões estão no cerne das ansiedades populacionais. A ultradireita capturou esse sentimento de medo e transformou-o em um ativo político. O fenômeno pode ser visto na Alemanha, com a ascensão do partido AfD, e na França, onde Michel Barnier, agora à frente do governo, adotou uma postura rígida sobre o controle de fronteiras.

No entanto, o que chama a atenção é o fato de que partidos de esquerda, como o socialista liderado pelo primeiro-ministro espanhol Pedro Sánchez, também estão aderindo a discursos mais restritivos. Sánchez defendeu a antecipação do Pacto Europeu sobre Migração e Asilo para 2025, o que evidencia como a busca por votos tem prevalecido sobre valores tradicionalmente progressistas. Esse é um exemplo claro da realpolitik em ação — quando a sobrevivência política supera os fundamentos ideológicos.

Essa mudança política não é desprovida de riscos. O bloco corre o perigo de enfraquecer suas proteções de asilo e refugiados, um pilar da política humanitária da União Europeia. Além disso, com conflitos e tragédias climáticas aumentando globalmente, a “solução” de fechar fronteiras e empurrar imigrantes para países fora da UE pode exacerbar ainda mais a crise migratória, criando novas ondas de instabilidade.

 

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