Cresce insatisfação dos britânicos com o Brexit

Ciro Dias Reis é CEO da Imagem Corporativa 25 de julho de 2023 3 minutos
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Um dos últimos sucessos dos Beatles foi “The Long and Winding Road”, música marcada por certa dose de tristeza e amargura.

Essa mesma “longa e sinuosa estrada” é imagem que pode ser associada a pesquisa do instituto YouGov que mostra desencanto crescente dos britânicos em relação ao Brexit.

Segundo o YouGov são agora 57% os eleitores que acreditam ter sido um erro deixar a União Europeia. Trata-se da maior parcela desde o referendo de junho de 2016. Apenas 32% acham que foi a decisão certa. Os números mostram uma tendência: dois anos atrás os eleitores a favor e o contra o Brexit estavam no mesmo patamar, mas desde então a diferença disparou em favor dos descontentes.

É possível definir essa tendência como resultado de uma série de fatores.

A frustração com as promessas não cumpridas pelos ativistas do Brexit é marcante. A economia britânica perdeu fôlego e o custo de vida subiu significativamente. E o sempre respeitado sistema nacional de saúde NHS, para o qual se previam recursos mais abundantes, não foi beneficiado como havia sido esboçado.

Algumas estatísticas tornam esse cenário mais claro.

As famílias do Reino Unido enfrentam hoje o momento de pior padrão de vida desde o penoso período de reconstrução no pós-guerra, nos anos 1950. Segundo o Office of National Statistics, o custo de vida é o maior problema e foi citado por 91% dos entrevistados em pesquisa da organização na primeira quinzena de junho.

A inflação entre maio de 2022 e maior de 2023 foi recorde: o índice de preços ao consumidor (CPIH) aumentou 9,7% no período, a taxa mais alta desde novembro de 1991. Mas a inflação específica de alimentos e bebidas avançou praticamente o dobro: 18,3%.

Em 2022, um em cada sete britânicos (ou 11,3 milhões de pessoas) passou fome segundo o Trussell Trust, uma organização social que opera uma rede de 1.300 bancos de alimentos no Reino Unido voltada para populações de baixa renda.

No ano passado foi o recorde o número de pessoas que dependeu do amplo sistema nacional de bancos de alimentos para ter o que colocar na mesa: 7% de todas as famílias britânicas estiveram nessas condições.

Além dos alimentos, o custo da energia elétrica tem castigado os consumidores: resultado direto da guerra na Ucrânia, os preços do gás natural e da eletricidade subiram, respectivamente, 94% e 56% nos seis primeiros meses depois da invasão do país pela Rússia, e mesmo começando a ceder nos meses posteriores ainda estão longe de voltar ao patamar anterior.

Em paralelo as taxas da casa própria quase dobraram em um ano, aumentando os custos de centenas de milhares de cidadãos que estão pagando financiamentos de longo prazo.

Todas essas variáveis explicam o fato de o instituto YouGov apontar que, pela primeira vez desde o referendo de junho de 2016, existe uma maioria de 51% britânicos que hoje votaria para retornar à União Europeia.

O governo conservador que há vários anos comanda os britânicos apoiou fortemente o Brexit e está pagando essa conta política. Números de maio do YouGov mostram que dos 37% dos eleitores que apoiaram a saída e disseram que o Brexit foi um fracasso, uma parcela de 75% culpa os “tories” pela jornada até aqui malsucedida.

Ganha com isso o Partido Trabalhista, que está quase 20 pontos à frente do Partido Conservador nas pesquisas de opinião. É um sinal de que as eleições gerais de 2024 podem trazer uma onda de mudanças na cena política local.

Mesmo com esse cenário recheado de sensibilidades uma certeza se mantém: um novo referendo para reabrir a questão do Brexit não deve ocorrer tão cedo.

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