De um escritório na periferia de Helsinque, uma assistente social se encontra com seis idosos de diferentes pontos da cidade para um almoço virtual – via tablets nas mesas da cozinha dos idosos. Pela meia hora seguinte, ela conversa com eles sobre como está sendo seu dia, pergunta sobre a saúde e recomenda que tomem sempre muito líquido, já que a desidratação é particularmente perigosa nessa idade (torna os idosos mais propensos a quedas, entre outras coisas). Copos d'água e leite são erguidos num brinde.
O grupo de almoço virtual é parte do programa de cuidados à distância com idosos mantido por Helsinque. Enquanto muitos países com crescente população de idosos estão construindo mais casas de repouso, a Finlândia não planeja fazer isso. Está optando por cuidar dos idosos em suas próprias casas pelo maior tempo possível – inclusive daqueles com demência que vivem sozinhos.
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O princípio básico da iniciativa é que, para qualquer pessoa, não importando a idade, “o lar é o melhor lugar”, diz Anna-Liisa Layytinen, do departamento de serviços sociais de Helsinque, segundo registra a revista The Economist. Enfermeiros e assistentes sociais visitam as casas, com frequência várias vezes por dia, para ajudar com refeições, banho, medicação ou simplesmente checar se está tudo bem.
Mas esse cuidado meticuloso e personalizado fica cada vez mais difícil de se proporcionar, à medida que a Finlândia envelhece. Em dez anos, o número de finlandeses com mais de 75 anos deve aumentar em 50%, com as pessoas vivendo mais e os baby-boomers ficando octogenários.
A resposta da Finlândia a esse desafio é a tecnologia – o que não surpreende num país que proclama ter o maior número per capita de startups voltadas para a saúde. Numa recente feira internacional tecnológica de saúde em Helsinque, muitas, se não a maioria, das novidades do pavilhão finlandês estavam relacionadas à ajuda para idosos fragilizados viverem com independência. Isso se desdobra em dois desafios: garantir que os assistentes sociais saibam imediatamente quando alguma coisa está errada (um idoso sofrer uma queda, por exemplo) e conter o declínio de mentes e corpos.
No programa municipal de cuidados em casa de Helsinque, cerca de 4 mil idosos estão equipados com vários dispositivos de segurança. Isso inclui pulseira com GPS, detector de quedas, botão de alarme e linha telefônica ligada com assistentes sociais que monitoram a localização do portador em telas de computador.
Nas portas de alguns idosos que sofrem de demência há sensores que enviam alertas caso o morador saia de casa. A maioria deles, porém, está tão fragilizada para caminhar que raramente sai, diz Hanna Hamainenm, ex-administradora do programa. Quando esses idosos saem, geralmente é para ir à casa de um amigo na vizinhança. Se acontecer, porém, de saírem no meio da noite, ou se afastarem muito de casa, assistentes sociais são enviados para localizá-los.
A tecnologia não substitui cuidadores, mas pode ajudá-los. O motivo mais comum para a visita de um assistente social à casa de um idoso em Helsinque é checar se ele está tomando sua medicação. Robôs podem controlar o fornecimento de remédios: cada um tem um suprimento para duas semanas das prescrições.
Os robôs também lembram o idoso que está na hora de tomar o remédio e qual a dosagem. Mas, para um em cada cinco idosos, os robôs não funcionam, geralmente porque o idoso reluta em tomar o que considera excesso de comprimidos ou tem demência em estado avançado. O restante dos idosos, contudo, precisa em média de apenas quatro visitas mensais de enfermeiros para fiscalizar a medicação.
A ideia de pessoas idosas vivendo sozinhas talvez preocupe menos os finlandeses que muitos outros povos. Os finlandeses se orgulham fortemente de sua autossuficiência. Brincando, eles dizem que um dos pesadelos do finlandês é ter que dizer “alô” para o vizinho. Para os idosos, no entanto, o isolamento social é um grande problema porque acelera o declínio físico e cognitivo.
Para lidar com essa tendência ao isolacionismo, Helsinque proporciona a seus idosos que vivem em casa atividades que incluem reuniões virtuais, jogos de adivinhação, cantar, exercícios físicos, clube do livro e discussões religiosas coordenadas por um sacerdote. Essas atividades, porém, devem ser vistas como “extras”: um certo grau de interação pessoal, não virtual, é sem dúvida necessário até mesmo para os finlandeses.
O maior desafio tanto para cuidadores humanos quanto para máquinas é detectar problemas ainda no início. Algumas cidades finlandesas estão testando tecnologias para acompanhar, de modo não obstrutivo, padrões de atividade de pessoas que vivem sozinhas. Empresas tech locais, incluindo MariCare Oy e Benete, desenvolveram sistemas que usam uma rede de sensores de movimento para reunir dados sobre coisas como quanto uma pessoa se move em casa e quantas vezes vai ao banheiro ou abre a geladeira.
Assistentes sociais usam esses dados para avaliar quais idosos devem ter prioridade de atendimento e o que checar em suas casas. Um aumento das idas ao banheiro, por exemplo, pode indicar uma infecção urinária. Deixar de abrir a geladeira pode significar que problemas de memória estejam se agravando.
Falhas acontecem
A tecnologia às vezes pode falhar. Pulseiras de GPS podem dar coordenadas erradas, levando a alarmes falsos. Um sensor pode não funcionar porque o idoso esqueceu uma toalha em cima. Alguns idosos não carregam os tablets. Esses problemas podem ser resolvidos. Mesmo assim, o percentual de contatos virtuais feitos por assistentes sociais em Helsinque não deve ir muito além dos atuais 8% (de um total de 250 mil visitas por mês).
O maior ganho proporcionado pela tecnologia pode ser o fato de ela capacitar mais idosos a viver por mais tempo em casa. Isso sai mais barato que construir casas de repouso e geralmente também torna mais agradável a vida do idoso.
Um finlandês de 65 anos pode esperar viver mais 20. É uma das maiores expectativas de vida da União Europeia. Por outro lado, a Finlândia está na metade inferior dos países da UE quando se considera por quantos desses anos extras o finlandês gozará de boa saúde. Eles têm uma dieta rica em gorduras e uma dedicação relativamente baixa a exercícios físicos, talvez porque os invernos sejam tão longos no país. Nem todos os problemas têm soluções tecnológicas.