A geopolítica do comércio transforma a Europa Oriental na nova China

24 de setembro de 2024 5 minutos
shutterstock

Um fenômeno crescente está moldando a dinâmica do comércio global: a desglobalização. Marcado pela ruptura das cadeias de fornecimento tradicionais e pelo aumento das tensões geopolíticas, esse processo está levando empresas a revisarem profundamente suas estratégias. Setores que antes viam na China o epicentro da produção global estão agora voltando seus olhos para regiões mais próximas e politicamente alinhadas, como a Europa Oriental.

Esse movimento, intensificado pela pandemia de COVID-19, as incertezas nas rotas logísticas globais e a crescente rivalidade entre grandes potências, tem um nome: nearshoring. A estratégia de produção mais próxima dos centros de consumo é vista como uma solução para a vulnerabilidade das cadeias de fornecimento globais. Em paralelo, práticas como friendshoring e reshoring ganham força, evidenciando uma mudança no paradigma do comércio internacional.

O conceito de nearshoring não é novo, mas as circunstâncias atuais tornaram-no mais relevante do que nunca. As empresas, que antes buscavam o menor custo possível para produção, agora estão considerando variáveis mais complexas. A segurança, a confiabilidade nas entregas e a proximidade dos mercados consumidores são aspectos cruciais que estão redefinindo as prioridades corporativas. Não adianta garantir contratos de fornecimento com preços competitivos se a entrega dos produtos torna-se incerta em um ambiente geopolítico volátil. Isso explica a crescente busca por centros produtivos alternativos que ofereçam maior estabilidade política e geográfica.

Nesse cenário, a Europa Oriental emerge como um novo centro de produção global. Países como Polônia, Romênia e Hungria, com mão de obra qualificada e custos relativamente baixos, estão cada vez mais se posicionando como substitutos naturais para a produção que antes era realizada na China. O fator proximidade com o mercado consumidor europeu, aliado à estabilidade política da União Europeia, torna a região uma opção altamente atrativa para empresas que desejam minimizar riscos e aumentar a eficiência logística.

Além disso, as cadeias de fornecimento encurtadas são vistas como uma forma de reduzir a dependência das rotas marítimas asiáticas, que estão sob constante pressão devido a tensões geopolíticas e desafios logísticos. A pandemia de COVID-19, por exemplo, mostrou como a interrupção no transporte marítimo global pode causar atrasos massivos, impactando diretamente a capacidade de atender mercados com produtos de alta demanda.

Nesse contexto, segue ganhando relevância um processo que pode ser chamado de ‘desglobalização’ do comércio mundial. Ele é resultante de variáveis como os efeitos disruptivos da covid19; tensões geopolíticas; novos riscos em tradicionais rotas marítimas e sistemas logísticos. Esse cenário tem levado empresas de diferentes setores a uma ampla revisão de suas estratégias.

Nearshoring (produção mais próxima dos centros de consumo), friendshoring (produção em geografias consideradas politicamente amigas confiáveis) e reshoring (retomada de produção local em substituição a compras em outros países ou regiões) tornaram-se estratégias corporativas importantes. O tradicional custo-benefício deixou de ser, em um mundo conturbado, variável predominante, pois de nada adianta fechar contratos de fornecimento por preços competitivos se aumentam os riscos de ter a encomenda entregue a tempo, de forma confiável.

Enquanto a Europa Oriental assume um papel mais relevante na cadeia produtiva global, o cenário nas Américas também reflete essa mudança. O México, por exemplo, ultrapassou a China como principal exportador de produtos para os Estados Unidos pela primeira vez em mais de duas décadas. Essa mudança é fruto das tensões crescentes entre Washington e Pequim, que estão criando obstáculos no comércio bilateral.

O contexto é claro: as tensões entre Washington e Pequim estão criando obstáculos no comércio entre os dois governos, e os EUA têm preferido importar produtos de países que considera mais confiáveis. Resultado: o valor das mercadorias made in Mexico importadas pelos americanos cresceu mais de 4% entre 2022 e 2023, alcançando US$ 475 bilhões. Em paralelo, as importações de produtos chineses pelos Estados Unidos caíram 20%, descendo para US$ 427 bilhões.

Essa tendência reflete um ajuste global nas cadeias de suprimentos, com as potências ocidentais buscando alinhar suas estratégias de comércio com parceiros considerados mais confiáveis e próximos geograficamente. Esse realinhamento não apenas ressignifica o papel da China como fábrica do mundo, mas também amplia as oportunidades para regiões como a Europa Oriental, que se posicionam para capitalizar essa nova era do comércio global.

Desafios para a Europa Oriental

A transformação da Europa Oriental em um novo hub produtivo traz consigo oportunidades e desafios. Por um lado, a proximidade com os principais mercados consumidores da União Europeia oferece uma vantagem competitiva crucial. Por outro, a região ainda enfrenta desafios relacionados à infraestrutura e à dependência de energias fósseis, o que pode limitar sua capacidade de competir diretamente com gigantes como a China.

O nearshoring na Europa Oriental também coloca pressão sobre governos e empresas locais para modernizarem suas infraestruturas logísticas e digitais. O sucesso dessa estratégia dependerá da capacidade dos países de melhorar suas condições operacionais e atrair investimentos estrangeiros que possam impulsionar o crescimento da produção local.

Europeanway

Busca