Von der Leyen enfrenta duplo teste político em Bruxelas enquanto críticas se intensificam

07 de outubro de 2025 4 minutos
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Ursula von der Leyen iniciou a semana sob fogo cruzado no Parlamento Europeu. Um dia após enfrentar um debate tenso sobre duas moções de censura distintas, apresentadas simultaneamente pela extrema-direita e pela extrema-esquerda, a presidente da Comissão Europeia aguarda agora a votação marcada para quinta-feira, que deve confirmar sua permanência no cargo, mas não sem revelar as rachaduras crescentes na coalizão que sustenta seu segundo mandato.

As duas moções, apresentadas pelos Patriotas pela Europa (PfE) e pelo grupo A Esquerda, têm poucas chances de sucesso, já que exigem maioria qualificada de dois terços dos votos. Mas seu peso simbólico é inegável: elas expõem o desgaste político de Von der Leyen e a erosão do consenso centrista que a reelegeu há apenas três meses.

Os ataques vieram de lados opostos do espectro político, mas convergiram em dois temas centrais: os acordos comerciais firmados por Von der Leyen e o estilo considerado cada vez mais centralizador de sua gestão.

Tanto a extrema-direita quanto a esquerda denunciam o novo acordo comercial com os Estados Unidos, que  segundo ambos impôs condições desvantajosas aos exportadores europeus. Também criticam o acordo UE-Mercosul, em fase final de adoção, por supostamente ameaçar os agricultores do continente.

Mas, fora essa convergência, as motivações são distintas.

Os Patriotas pela Europa acusam a Comissão de fracassar na gestão da migração irregular e de impor políticas ecológicas “ideológicas” que prejudicam a competitividade industrial. Já A Esquerda condena o que chama de “inércia moral” da presidente diante da guerra em Gaza e de “incapacidade estrutural” para enfrentar as crises climática e social.

Durante o debate de ontem, Von der Leyen buscou reposicionar o tom, defendendo sua política externa e alertando para o risco de divisões internas alimentadas por potências externas. “Não podemos cair na armadilha de Vladimir Putin”, disse, numa referência às tentativas russas de explorar fissuras dentro da União Europeia.

Um Parlamento fragmentado

O resultado da sessão de quinta-feira parece previsível: Von der Leyen deve sobreviver graças à maioria centrista formada pelo Partido Popular Europeu (PPE), pelos Socialistas & Democratas (S&D) e pelos liberais do Renew Europe – a mesma aliança que garantiu sua reeleição em julho.

Ainda assim, há sinais de fadiga nessa base. O Renew Europe, por meio de seu porta-voz Vincent Stuer, já alertou que não pretende “transformar moções de censura em um jogo mensal”, e os Verdes, embora divididos, devem em sua maioria manter o apoio à presidente.

No entanto, o simples fato de Von der Leyen enfrentar duas moções em menos de 90 dias mostra um enfraquecimento de sua autoridade política e o esgarçamento de sua coalizão de governabilidade. “É um sinal de fadiga institucional”, resumiu um eurodeputado socialista ouvido pela Euronews.

Von der Leyen chega a este novo teste em um contexto de pressões múltiplas. A economia europeia cresce de forma anêmica, e o projeto de rearmamento continental – o Readiness 2030, de € 800 bilhões – enfrenta resistência dos países do norte.

A relação com os Estados Unidos tornou-se mais tensa sob a nova administração Trump, que exige contrapartidas comerciais agressivas em setores estratégicos como energia e semicondutores. Pesquisas apontam crescente insatisfação popular com os termos do novo acordo comercial transatlântico.

Internamente, sua gestão é criticada por falta de transparência na elaboração do orçamento plurianual da União e por uma tendência a concentrar decisões no núcleo político da Comissão.

No campo geopolítico, Von der Leyen tenta equilibrar a defesa da Ucrânia com a crescente pressão para adotar uma postura mais firme em relação a Israel, depois de ter proposto no mês passado a suspensão parcial do Acordo de Associação UE-Israel, medida que ainda depende da aprovação dos Estados-membros.

A votação de quinta-feira dificilmente resultará em sua destituição. Mas, para muitos observadores, o verdadeiro teste não é o resultado formal, e sim o saldo político. Von der Leyen deve sobreviver, mas emerge com autoridade fragilizada e um desafio claro: reconstruir pontes entre o PPE e os socialistas, conter o flerte de seu partido com a extrema-direita e redefinir sua agenda em meio a um continente dividido entre ambição estratégica e fadiga política.

O segundo mandato de Ursula von der Leyen, que começou como promessa de estabilidade, transformou-se em um campo de disputa entre o pragmatismo institucional e o cansaço de um eleitorado europeu cada vez mais cético. O resultado de quinta-feira pode confirmar sua sobrevivência.

 

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