
Quatro megaempreendimentos de infraestrutura colocam a Itália no centro de um redesenho logístico que promete encurtar distâncias entre grandes cidades, aliviar estradas congestionadas e aproximar o Mediterrâneo do coração econômico da Europa. Túnel alpino, linhas de alta velocidade e a sonhada ponte sobre o Estreito de Messina começam a avançar em ritmo mais acelerado, com impacto previsto para a próxima década.
O mais simbólico avanço ocorreu neste ano, com a perfuração do túnel exploratório do Brenner Base Tunnel, na fronteira entre Itália e Áustria. A galeria, que se estende por 64 quilômetros quando conectada às linhas existentes, será o maior túnel ferroviário subterrâneo do mundo. A expectativa é que, até 2032, trens cruzem os Alpes a 250 km/h, reduzindo em mais da metade o tempo de viagem entre Verona e Munique. Mais do que velocidade, o projeto atende a uma urgência ambiental ao retirar caminhões das rodovias alpinas, por onde passam mais de 2,5 milhões de veículos pesados todos os anos.
Outro elo estratégico é a ligação Lyon Turim, que atravessará os Alpes ocidentais com um túnel de base de 57,5 quilômetros. Cofinanciado pela União Europeia, França e Itália, o projeto pretende retirar 1 milhão de caminhões anuais da rota entre Paris e Milão. Após anos de protestos ambientais e impasses regulatórios, a obra ganhou novo fôlego em 2025, ao receber da Comissão Europeia o status de prioridade estratégica, o que assegura recursos adicionais. A conclusão está prevista para 2033.
No eixo interno, a linha Tortona Gênova, conhecida como Terzo Valico, está em fase final de construção e deve entrar em operação já em 2026. São 53 quilômetros de trilhos, sendo 37 de túneis, encurtando o trajeto entre Milão e o principal porto italiano. A obra é vista como essencial para transferir parte do transporte de mercadorias dos portos ligures para o norte europeu por ferrovia, em um país cuja logística ainda depende fortemente das rodovias.
Mais ao sul, a ponte sobre o Estreito de Messina, anunciada e cancelada inúmeras vezes ao longo de décadas, voltou a ganhar prioridade política. Com custo estimado em 13,5 bilhões de euros e conclusão prevista para 2032, a estrutura ligará a Sicília ao continente com seis faixas de tráfego e duas linhas férreas. A iniciativa, que já enfrentou ceticismo ambiental e financeiro, é tratada pelo governo de Giorgia Meloni como símbolo de integração territorial e motor de desenvolvimento para o sul da Itália.
Essas obras fazem parte dos corredores RTE-T, a rede transeuropeia de transportes, e contam em grande medida com recursos de fundos de recuperação da pandemia. Estima se que apenas o Brenner e o Lyon Turim tenham mobilizado mais de 20 bilhões de euros até agora.
O retorno esperado é expressivo. Entre os benefícios projetados estão a redução de emissões de CO2, melhora da qualidade do ar em áreas de montanha, menores custos logísticos e maior competitividade para exportações italianas. O setor privado também se beneficia. Construtoras como a Webuild assumiram papel central e veem nessas obras um laboratório de inovação técnica e geotécnica.
Os riscos, no entanto, permanecem. Custos bilionários sujeitos à inflação, complexidade geológica, oposição ambiental e mudanças de governo podem comprometer prazos e prioridades. O histórico da ponte de Messina, idealizada desde o Império Romano mas sempre adiada, ilustra a fragilidade política de projetos dessa magnitude.
Se os cronogramas forem mantidos, o início da década de 2030 verá um continente redesenhado. Milão e Paris estarão a quatro horas e meia de trem. Gênova se tornará praticamente subúrbio ferroviário de Milão. Verona e Munique ficarão a menos de três horas de distância. E a Sicília, finalmente, deixará de ser uma ilha em termos de transporte.