Scandinavian Day ganha força como elo entre Brasil e Escandinávia

Em sua segunda edição, evento reuniu representantes de empresas e instituições escandinavas para discutir a visão dos países da região sobre valores e negócios

06 de novembro de 2019 9 minutos
Europeanway

Transparência, relação de confiança, valorização das pessoas, hierarquia menos rígida no ambiente de trabalho, políticas de diversidade nas empresas e o fortalecimento da democracia foram as principais mensagens levadas por executivos e pesquisadores à segunda edição do Scandinavian Day. O evento – que cresceu neste ano, ganhando força como um espaço de cooperação entre o Brasil e os países escandinavos – foi realizado nesta quarta-feira (6/11), em São Paulo.

 

Com o tema “Valores e Negócios: A Experiência Escandinava”, o Scandinavian Day reuniu representantes de empresas e instituições da Dinamarca, Finlândia, Islândia, Noruega e Suécia para apresentar iniciativas bem-sucedidas de suas organizações em frentes como liberdade de imprensa e informação, transparência, sustentabilidade e igualdade de gênero. Em todas elas, esses países têm reconhecido protagonismo internacional.

“Os países nórdicos figuram sempre com grande destaque em todos os rankings e comparações globais que mensuram índices de nível de transparência, confiança e preocupação com o meio ambiente, e é claro que isso não é obra do acaso. É fruto de uma série de aprendizados e compromissos dessa sociedade, que se traduz em um modus vivendi que, para nós, deve ser objeto de inspiração. O Scandinavian Day visa a promover o intercâmbio de ideias e estimular que muitas das iniciativas criadas e implantadas na Escandinávia passem também a fazer parte do dia a dia das companhias no Brasil”, explica Ciro Dias Reis, CEO e fundador da consultoria Imagem Corporativa, organizadora do evento.

Na abertura da programação, Jouko Leinonen, embaixador da Finlândia no Brasil, reiterou a importância de eventos como o Scandinavian Day para promover um desenvolvimento pacífico e equilibrado das duas sociedades. “A cooperação entre brasileiros e escandinavos tem sido útil e produtiva, mas ainda penso que temos que fazer mais. Tanto nós quanto vocês temos virtudes que devem ser ressaltadas, como as ações que vêm sendo feitas em termos de diversidade e igualdade de gênero, alguns dos temas abordados nesta edição”, afirmou.

Informação e cultura fortalecem a democracia

Logo no início de “Informação, Cultura e Democracia”, o primeiro painel do dia, Mads Bjelke Damgaard, pesquisador da Universidade de Copenhague, falou, em participação remota, que a disseminação de notícias falsas, um problema no Brasil, também afeta a Dinamarca, um dos países mais bem-avaliados em liberdade de imprensa no mundo. “Liberdade de imprensa também significa liberdade para errar, desinformar (de maneira proposital ou não) ou informar de forma distorcida”, disse. Um dos antídotos para isso, acredita, é que jornalistas e veículos sejam cada vez mais transparentes sobre as decisões editoriais que tomam.

Transparência e livre circulação de ideias como ferramentas para fortalecer a democracia foram alguns dos pontos discutidos por André Palme, que comanda a operação brasileira da empresa sueca Storytel, e Guilherme France, coordenador de pesquisa da Transparência Internacional. A disseminação da informação e cultura por meio de plataformas de streaming, como a Storytel, é uma forte aliada nesses esforços, defendeu Palme. France, por sua vez, enfatizou a necessidade de o Brasil acentuar políticas públicas que fortaleçam ainda mais a luta contra a corrupção – e combater a corrupção é também fortalecer a democracia.

Transparência é um valor – e também estratégia de negócios

No painel “Transparência e Compliance”, Tormod Tingstad, sócio do escritório de advocacia dinamarquês Kammeradvokaten Poul Schmith, Paula Pereira, Senior Compliance Officer da empresa de energia norueguesa Statkraft, e Olle Widén, CEO da FinanZero, fintech de origem sueca, foram unânimes na avaliação de que as regras de compliance em países escandinavos são regidas por duas palavras-chave: transparência e confiança.

O trio destacou também a importância de equilibrar a criação de boas práticas sem que isso amarre a empresa em burocracias desnecessárias. “As políticas de compliance precisam se voltar mais para os valores básicos da empresa”, disse Tingstad. “Temos que tratar desse tema de maneira mais comprometida, e não apenas usar slogans.” Para Paula Pereira, “compliance é parte da personalidade dos noruegueses. Eles entendem isso como sendo parte do seu trabalho. Está embutido na cultura da empresa.”

Ao falar sobre transparência no setor financeiro, Widén contou que foi justamente a lacuna nesse quesito um dos pontos centrais para a abertura da fintech no Brasil. “Fizemos uma pesquisa de mercado e vimos que a pouca transparência no mercado de crédito, dominado por grandes bancos, era uma oportunidade de negócio. Não se trata apenas de conceder o empréstimo, mas oferecer diferentes opções de produtos e taxas de juros, de diferentes instituições e apresentar o máximo de informações, da forma mais educativa e transparente possível”, disse.

Sustentabilidade e inovação como motores de crescimento

A discussão em “Sustentabilidade e Inovação”, o terceiro painel do Scandinavian Day, girou em torno de novidades trazidas por setores de primeira necessidade, como energia e alimentação. A islandesa Marel, empresa que fornece tecnologia e serviços para a indústria de processamento de carnes, peixe e frango, contou que tem redobrado seus esforços para, de maneira inovadora e sustentável, oferecer respostas para um dilema global: como alimentar a população do planeta, que não para de crescer.

“A previsão é de que a população cresça 31% até 2050. O consumo de alimento vai aumentar mais de 50% nesse mesmo período, mas corremos o risco de escassez de recursos importantes, como a água. Por isso, essa busca constante pela inovação, pela eficiência”, disse Clausius Nobrega, diretor da Marel para a América Latina.

Jonathan Colombo, gerente de Relações Institucionais da dinamarquesa Vestas, disse que entre os objetivos da empresa, uma das líderes globais em energia eólica, está o de baratear o custo da energia e disseminar a cultura do uso de fontes renováveis. Como exemplo, ele citou operações implantadas recentemente em países como Quênia e Senegal. “No Quênia, além de levarmos eletricidade a quem não tinha antes, também temos como meta tornar o país autossustentável em energia limpa até o ano que vem”, contou.

O finlandês Juha Leppänen, CEO da consultoria Demos Helsinki, defendeu a ideia de que sustentabilidade e inovação têm que ser pensadas como parte de um mesmo esforço. “É preciso inovar, mas também adotar as melhores práticas. Temos que nos assegurar que a inovação nas empresas sirva a toda a sociedade, e não apenas à esfera privada”, afirmou. “A inovação tem que ser regida por um propósito sustentável.”

Inclusão e diversidade à escandinava

O quarto e último painel do evento debateu algumas das boas práticas empresariais em diversidade e igualdade de gênero. As políticas de governos e empresas da Escandinávia nessa frente estão entre as mais avançadas e elogiadas do mundo – e muitas dessas iniciativas têm sido disseminadas no Brasil por meio das operações que as companhias da região têm no país.

A diretora de Pessoas e Lideranças da Equinor, Ida Christina Killinberg, disse que a estatal norueguesa de óleo e gás tem a ambição de ter uma equipe 100% inclusiva até 2025, mas não deixou de apontar a dificuldade em recrutar mulheres em uma indústria historicamente dominada por homens – na Equinor, 30% da mão de obra é feminina. Ainda assim, ela diz que a meta é perseguir a equidade. “Queremos mais mulheres como gerentes nas nossas plataformas. Globalmente, criamos um programa de recrutamento dos dois gêneros, e queremos chegar a 50% de homens e 50% de mulheres”, disse.

A Nokia, de origem finlandesa, também atestou a dificuldade de encontrar profissionais mulheres em áreas como a engenharia, o que não afasta a companhia de perseguir a equidade de gênero em suas operações – hoje, 20% da força de trabalho na empresa é feminina. Uma dessas iniciativas foi revelada em primeira mão no Scandinavian Day por Gabriela Fernandes, diretora de recursos humanos da Nokia: “A partir do ano que vem, vamos ter sempre no mínimo uma mulher nos processos de seleção de profissionais – e em todas as áreas”, contou ela.

Marcia Silva, diretora de Operações da Yara, empresa norueguesa do setor de fertilizantes, falou da relevância que as iniciativas da operação brasileira têm sobre os destinos da companhia. “Dos 17 mil funcionários da empresa, 7 mil estão no Brasil”, contou. “E em algumas iniciativas, nós é que acabamos sendo os pioneiros.” Uma delas foi a estruturação de um programa de diversidade, que hoje funciona em quatro frentes: gênero, étnica, pessoas com deficiência e público LGBT+. O programa, que começou no Brasil em 2016, foi adotado pela Yara International neste ano.

Políticas de diversidade e igualdade de gênero como as adotadas por Equinor e Yara, duas empresas norueguesas, estão entre as mais avançadas no mundo corporativo, mas há também companhias da Noruega que atuam no Brasil não deixam a desejar nessas frentes. A agência de inovação e desenvolvimento Innovation Norway, em parceria com entidades como ONU Mulheres e Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan), pretende mudar isso com a criação de um guia de boas práticas. A ideia é “trazer mais a mentalidade” dos noruegueses para o cotidiano dessas empresas, afirma Pilar Neves, gerente de Projetos da Innovation Norway. O lançamento do guia, destinado às cerca de 170 empresas norueguesas que atuam no Brasil, está previsto para julho de 2020.

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