Repensar a indústria no Brasil exige olhar para Europa, EUA e China

Ciro Dias Reis, presidente da Imagem Corporativa 16 de junho de 2023 5 minutos
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O setor industrial já foi a grande estrela da economia brasileira nos anos 1980 e 1990 e 2000, mas vem perdendo relevância e participação no PIB nacional de forma constante desde a segunda década do século 21.

Se nos anos 1980 a indústria atingiu o pico de 36% de participação no PIB, esse número era de 23% em 2011 e 19% em 2021.

A indústria nacional há tempos critica o chamado “Custo Brasil”, conjunto de variáveis que inclui infraestrutura deficiente, burocracia, complexidade tributária e custo do dinheiro.

Há poucos dias o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o vice-presidente Geraldo Alckmin assinaram um artigo conjunto no jornal O Estado de S. Paulo intitulado “Neoindustrialização para o país que queremos”, uma senha para informar que o governo está aberto para discutir com lideranças do setor maneiras de revitalizá-lo. Mas o país não é um caso isolado na busca de cenários mais positivos para o setor industrial.

A União Europeia já optou por uma nova abordagem da indústria na região em tempos pós-Covid. O caminho escolhido aponta na direção de uma economia de baixo carbono e isso requer inovação, investimento e treinamento de pessoas em um mercado de trabalho que começa a se transformar profundamente. A nova estratégia do bloco europeu no âmbito industrial inclui a redução estratégica da dependência de países como a China, hoje grande fornecedora global dos mais variados produtos.

Também a maior economia do planeta repensa de forma integrada uma nova fase para sua indústria. Esse setor viu diminuir sua participação no PIB total do planeta ao longo das últimas décadas, resultado tanto de uma globalização que reordenou processos produtivos como pelo avanço expressivo de players altamente competitivos como China e Coréia do Sul. Hoje o setor responde por 12% do PIB dos Estados Unidos, e 8% do emprego direto, mas sua contribuição macroeconômica é muito maior segundo a consultoria McKinsey: suas empresas são responsáveis por 20% dos investimentos de capital do país, além de 35% do crescimento da produtividade, 60% das exportações e 70% dos aportes em pesquisa e desenvolvimento.

Nas últimas décadas, enquanto as linhas de montagem perdiam parte do protagonismo de outros tempos, as atividades de design, serviços e software ganharam musculatura no cenário econômico americano.

E sob o comando de Joe Biden o país tem aprovado diversas leis que se destinam a abrir espaço para uma nova era de ouro da indústria. A “Chips Act” aprovada em julho do ano passado prevê US$ 39 bilhões para estimular a fabricação doméstica de semicondutores (livrando o país da dependência incômoda da produção asiática) e garantir investimentos crescentes em pesquisa e desenvolvimento. Por sua vez, a “Inflation Reduction Act” aprovada em agosto, destina-se a incentivar a adoção de fontes de energia mais limpas. As duas medidas podem ser vistas como complementares e sua combinação sugere um plano de voo consistente para revigorar o setor industrial do país e aumentar a competitividade nacional.

Igualmente relevante é o cada vez mais proclamado fator “Buy American”, que vai muito além do slogan. Produtos “Made in USA” tem preferência em determinadas compras governamentais e também têm conseguido atrair maior número de consumidores graças a créditos fiscais que respaldam o avanço da atividade industrial.

Mais: em 2021, o Congresso aprovou US$ 1,2 trilhão em gastos com infraestrutura, capazes de gerar redução de custos gerais das empresas e torná-las mais ágeis e competitivas.

Toda essa política de pontas bem amarradas já traz resultados. Segundo a empresa Morning Consult a demanda dos consumidores dos EUA por produtos “Made in America” é crescente: quase dois terços dos consumidores do país disseram que optaram mais frequentemente por itens nacionais em 2022.

Além disso parte da população se diz disposta a pagar mais por itens feitos no país, desde que os preços não sejam 10% mais altos em relação aos de produtos estrangeiros. Eleitores do Partido Republicano, por sinal, mostram-se mais propensos a esse desembolso adicional do que os eleitores do Partido Democrata. Isso faz sentido se lembrado o slogan do ex-presidente republicano Donald Trump, para quem nada mais importante do que a postura “America First”.

A questão política está presente também na forte percepção de que empresas multinacionais com sede em países aliados e amigos de Washington (como boa parte da Europa) têm mais chances de ganhar espaço no mercado americano, em comparação a empresas da China, por exemplo, com quem os Estados Unidos mantém atualmente uma relação sensível.

E a China, contra a qual todos se preparam para competir de forma cada vez mais acirrada, como formula sua própria estratégia na área industrial?

Sempre atento ao longo prazo o país lançou em 2015 (primeira de três etapas que se sucedem até 2050) seu programa de política industrial ‘Made in China 2025’. Ele é destinado a consolidar Beijing como potência global na chamada “4ª. Revolução Industrial” e garantir seu protagonismo no estabelecimento de padrões internacionais e cadeias de suprimento.

Apostando em inovação, robótica, inteligência artificial e big data de forma integrada (e também avançando em direção a uma economia verde) essa política industrial claramente desafia a hegemonia dos tradicionais países desenvolvidos do Ocidente e suas tradicionais corporações globais.

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