Na Suíça, bunkers ganham nova função em cenário de insegurança global

23 de julho de 2025 4 minutos
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Em tempos de guerra digital, drones autônomos e ataques híbridos, a Suíça está voltando os olhos para uma estrutura criada em outra era: os bunkers militares. Construídos para resistir à artilharia da Segunda Guerra Mundial e reforçados para sobreviver a ataques nucleares durante a Guerra Fria, esses abrigos subterrâneos, muitos deles esculpidos nos Alpes, estão prestes a ganhar uma nova vida. Agora, como parte de uma estratégia nacional de defesa adaptada ao século XXI.

A movimentação ocorre num momento em que o conceito de neutralidade suíça enfrenta novos testes. A invasão da Ucrânia pela Rússia em 2022 e a intensificação das tensões entre grandes potências reacenderam o debate sobre a prontidão defensiva do país alpino. A resposta do governo tem sido silenciosa, mas estratégica: reavaliar o destino dos mais de 8 mil bunkers espalhados pelo território nacional — alguns deles datando de 1886.

De relíquias da Guerra Fria a hubs tecnológicos

Por décadas, esses abrigos foram vendidos para civis ou convertidos para usos tão variados quanto adegas de queijo, galerias de arte, hotéis e até cofres de criptomoedas, como o famoso “Swiss Fort Knox”, no cantão de Berna. Estima-se que 360 mil bunkers civis foram construídos entre os anos 1960 e 1990, com o objetivo de oferecer proteção para 100% da população.

Hoje, a Suíça conta com cerca de 9,1 milhões de vagas em abrigos, mais do que o número de habitantes, que gira em torno de 8,7 milhões. Essa proporção se deve a uma antiga legislação nacional que, por décadas, exigia a construção obrigatória de bunkers em edifícios novos ou o pagamento de taxas compensatórias.

Desde 2023, no entanto, todas as vendas de bunkers foram suspensas pelo exército. O plano agora é transformar parte dessas estruturas em “nós de defesa difíceis de atacar”, equipados com tecnologias de ponta, operados com o mínimo de pessoal e com custos otimizados.

O Exército Suíço lançou um apelo a empresas de tecnologia, universidades e startups para encontrar usos modernos e criativos para esses espaços. A Sociedade Suíça de Tecnologia e Forças Armadas já anunciou um “dia de inovação” para setembro, em que especialistas de setores diversos poderão apresentar propostas para revitalizar os abrigos, seja em prol da segurança nacional, da ciberdefesa ou até mesmo da sustentabilidade energética.

A intenção é que os bunkers se tornem plataformas resilientes para comunicações criptografadas, proteção de dados sensíveis, centros de comando subterrâneos ou até abrigos de infraestrutura crítica. A movimentação também pode beneficiar o setor privado: há especulações sobre parcerias público-privadas para transformar alguns desses espaços em data centers ou hubs logísticos com proteção física robusta.

Além da frente militar, os cantões suíços também têm utilizado os abrigos com fins humanitários. Diante de fluxos migratórios crescentes e crises humanitárias, alguns bunkers foram adaptados para acolher refugiados temporariamente, uma função que remete ao princípio original de proteção civil que guiou a construção em massa dessas estruturas.

Contudo, especialistas alertam que reativar bunkers exige mais do que reforçar portas de aço. A maioria desses abrigos foi construída para resistir a bombas, mas não a ataques cibernéticos ou interferência eletrônica. A atualização precisa ser funcional e estratégica, ou será apenas simbólica.

A iniciativa suíça deve ser observada dentro de um contexto europeu mais amplo. A Espanha, por exemplo, tem construído bunkers de luxo para elites temerosas de um colapso geopolítico. Em países bálticos, como Estônia e Letônia, a reativação de estruturas de defesa da era soviética também está em curso.

 

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