Com tarifa de 15% já em vigor, setor de vinhos da Europa projeta retração nas exportações aos Estados Unidos

06 de agosto de 2025 4 minutos
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Desde 1º de agosto, vinhos e bebidas destiladas da União Europeia passaram a ser taxados em 15% pelos Estados Unidos, como resultado do novo acordo comercial firmado entre Washington e Bruxelas. A medida, embora temporária, acendeu o alerta entre produtores europeus, que agora projetam perdas expressivas em um dos seus mercados mais estratégicos.

Os números mostram o tamanho do impacto. Em 2024, os Estados Unidos importaram 6,79 bilhões de dólares em vinhos europeus, somando 1,226 bilhão de litros, com preço médio de 5,54 dólares por litro. Apenas entre janeiro e abril de 2025, a França exportou 984,9 milhões de dólares em vinhos para os Estados Unidos, uma alta de 33,1% em relação ao mesmo período do ano anterior. A Itália também registrou crescimento, com 798,4 milhões de dólares exportados, avanço de 13,8%. No total, a União Europeia destinou cerca de 8,9 bilhões de euros em bebidas alcoólicas ao mercado norte-americano em 2024, sendo mais da metade em vinhos.

O Comitê Europeu das Empresas Vinícolas (CEEV) alerta que, somada à valorização do euro frente ao dólar, a nova tarifa pode gerar um impacto financeiro de até 30% sobre os preços finais, interrompendo investimentos e reduzindo os volumes exportados no curto prazo.

A preocupação não é exclusiva do lado europeu. A coalizão Toasts Not Tariffs, formada por 57 organizações da cadeia alcoólica dos Estados Unidos e da Europa, estima que as tarifas podem causar uma perda de até 2 bilhões de dólares em vendas e colocar em risco cerca de 25 mil empregos, especialmente em pequenos importadores, distribuidores e redes de varejo especializadas.

Autoridades europeias confirmaram que as negociações para tentar excluir vinhos e destilados do alcance da tarifa continuarão nos próximos meses, mas nenhuma mudança é esperada antes do outono no hemisfério norte. Enquanto isso, o setor lida com margens comprimidas e maior concorrência de países como Chile, Austrália e África do Sul, que não enfrentam as mesmas barreiras comerciais.

Mas o desafio do setor vai além das barreiras alfandegárias. A indústria vinícola europeia vive também uma transformação no comportamento do consumidor. Especialistas apontam que jovens estão cada vez mais inclinados a consumir vinhos mais leves, gaseificados ou mesmo sem álcool. O fenômeno, que começou em nichos alternativos, ganha agora escala comercial. Bordeaux, um dos centros mais tradicionais do vinho mundial, abriga desde 2024 a Belles Grappes, uma loja inteiramente dedicada a vinhos desalcoólicos e bebidas similares, com rótulos não apenas da França, mas também da Alemanha, Áustria e outros países.

A tendência tem levado grandes players a investir no segmento. A vinícola espanhola Familia Torres anunciou recentemente um aporte de 6 milhões de euros na construção de uma adega voltada exclusivamente para vinhos desalcoólicos. No Reino Unido, uma pesquisa da YouGov em parceria com o grupo Portman revelou que 38% dos consumidores de álcool já incluem alternativas com baixo ou nenhum teor alcoólico em seus hábitos regulares.

Diante desse cenário, a Comissão Europeia passou a reconhecer oficialmente os termos “desalcoólico” e “parcialmente desalcoólico” dentro de critérios regulatórios específicos. No final de 2023, foi formado um grupo de alto nível para estudar os desafios da indústria vinícola do bloco. Entre as recomendações, está o incentivo à produção de “novos produtos da videira mais alinhados às demandas emergentes dos consumidores”, sem comprometer a identidade do setor.

A pressão se intensifica com propostas como a da Organização Mundial da Saúde para inclusão de alertas sobre os riscos do consumo de álcool nos rótulos das garrafas, seguindo o modelo dos avisos em maços de cigarro. Rejeitada em 2023 por países produtores como Portugal, França e Itália, a ideia volta ao centro do debate.

A conjunção de fatores tarifários, regulatórios, cambiais e culturais redesenha o mapa de riscos para o setor de vinhos da Europa. Em um ambiente de crescente fragmentação comercial e transformação de hábitos, produtores e exportadores terão que reagir com agilidade e inteligência para preservar competitividade em um mercado global mais instável e exigente.

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