
Na conferência realizada em Belém, Brasil e França protagonizam uma iniciativa inédita para enfrentar a proliferação de fake news sobre as mudanças climáticas, com foco em fortalecer a integridade da informação e proteger o jornalismo investigativo.
Por meio da Iniciativa Global para a Integridade da Informação sobre a Mudança do Clima, os dois países buscam centralizar o debate sobre desinformação climática nas negociações internacionais. A coalizão conta com apoio da ONU, da UNESCO e de outros governos, propondo soluções concretas para mitigar táticas como o negacionismo e o greenwashing.
A relevância da iniciativa é reforçada pelo fato de que, pela primeira vez, o tema da integridade informacional entra oficialmente na Agenda de Ação do encontro, algo considerado inovador na diplomacia climática.
Declaração global e compromisso multilateral
Durante a conferência, foi assinada uma Declaração sobre Integridade da Informação Climática, que reúne compromissos de diferentes nações em três níveis: internacional, nacional e local.
Até agora, países como Brasil, França, Canadá, Chile, Dinamarca, Alemanha, Espanha, Suécia e Uruguai já aderiram ao documento, demonstrando força política para transformar a luta contra a desinformação em uma agenda climática estratégica.
A coalizão lançou um chamado à ação, sob a forma de um mutirão global, para apoiar projetos baseados em evidência científica:
- Serão aceitas propostas para pesquisa sobre desinformação climática
- Desenvolvimento de ferramentas de comunicação e campanhas para educação midiática
- Apoio a jornalistas que investigam temas climáticos
- Projetos que aumentem a transparência em anúncios digitais relacionados ao clima
- Iniciativas que promovam o letramento digital e midiático em torno das mudanças climáticas
As propostas selecionadas podem entrar para a Agenda de Ação Climática da conferência, o que significa que ideias emergentes ganham visibilidade internacional.
Além disso, existe um Fundo Global para a Integridade da Informação Climática, gerido pela UNESCO, que será alimentado por doações para financiar projetos com impacto real.
Por que isso importa
Em um contexto em que a desinformação climática pode minar a confiança pública em políticas ambientais, essa iniciativa surge como uma ferramenta diplomática estratégica. Frederico Assis, enviado especial para integridade da informação, afirmou que “informações falsas ou distorcidas podem minar a credibilidade de todo o processo, desestimular o engajamento da população e alimentar narrativas que legitimam o imobilismo.”
Relatórios científicos também sustentam a urgência dessa pauta: o IPCC já alertou que a desinformação deliberada enfraquece a percepção pública de consenso científico, atrasando políticas climáticas.
A estratégia brasileira: articulação e alianças
O Brasil articula uma rede nacional de organizações para reforçar essa pauta, reunindo instituições da sociedade civil, universidades e especialistas internacionais para ações conjuntas de combate à desinformação climática.
Nina Santos, secretária-adjunta da Secretaria de Políticas Digitais, defendeu que é preciso mais do que checagem pontual: “soluções estruturais” como educação midiática são fundamentais para responder ao negacionismo climático.
Durante o evento, o governo brasileiro também lançou documentos para lidar com a desinformação no contexto da publicidade digital. Em parceria com ONGs e cientistas, foram apresentados um guia jurídico para a integridade da informação climática e uma carta-compromisso para práticas mais transparentes na publicidade digital.
Um novo paradigma
Essa iniciativa tem potencial para remodelar a geopolítica climática: ao colocar a desinformação no centro das negociações, Brasil e França sinalizam que a crise ambiental não pode ser enfrentada apenas com tecnologias e cortes de emissão, mas também com infraestrutura informacional — ou seja, construindo ecossistemas de informação robustos, baseados em evidência e resistentes a distorções.
Além disso, ao mobilizar governos, sociedade civil, acadêmicos e órgãos internacionais, a Iniciativa Global cria uma rede multissetorial que pode sustentar ações de longo prazo, mesmo após a COP30.






