Até as Ilhas Faroe são alvo da "guerra fria" entre China e EUA

Americanos tentam barrar parceria entre o arquipélago, controlado pela Dinamarca, e a empresa chinesa Huawei para a criação de rede de telefonia 5G

09 de janeiro de 2020 5 minutos
Europeanway

Localizadas entre a Islândia e a Noruega, as Ilhas Faroe são um ponto remoto ao norte do planeta, habitado por papagaios-do-mar e visitado periodicamente por baleias. É difícil imaginar que as 18 ilhas do arquipélago, um território semiautônomo controlado pela Dinamarca onde vivem apenas 50 mil pessoas, sejam alvo de disputa comercial e tecnológica entre Estados Unidos e China, as duas maiores potências econômicas do planeta. Mas é isso mesmo o que tem acontecido.

Com planos de construir uma nova rede sem fio 5G, como é chamada a tecnologia de quinta geração, o governo das ilhas considerou repassar o projeto a um provedor de tecnologia. E a "guerra fria tecnológica" entre chineses e americanos ganhou um novo capítulo quando os EUA pediram ao arquipélago que não dessem o contrato à gigante chinesa Huawei.

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Na esteira dessa disputa, que soa impensável sob muitos aspectos, as autoridades da China entraram em campo. Em uma gravação recente, um funcionário do governo das Ilhas Faroe disse que os chineses haviam se oferecido para aumentar o comércio entre o território e a China, desde que a Huawei obtivesse o contrato.

"Comercialmente, as Ilhas Faroe não podem ser muito importantes para a Huawei ou qualquer outra pessoa", disse ao jornal The New York Times Sjurdur Skaale, que representa o território no Parlamento dinamarquês. “O fato de embaixadas chinesas e americanas lutarem por isso com tanta intensidade indica que há algo mais sobre a mesa. É mais do que apenas mais um negócio."

Há mais de um ano, as autoridades americanas têm pressionado Reino Unido, Alemanha, Polônia e outras nações a seguir seu exemplo e proibir a Huawei de participar de novas redes 5G. No entanto, se os países europeus estiverem do lado de Washington, eles correm o risco de prejudicar seus laços econômicos com a China.

Nas Ilhas Faroe, Bardur Nielsen, o primeiro-ministro, tentou acalmar o conflito. Em um comunicado, ele disse que seu governo "não foi pressionado ou ameaçado por autoridades estrangeiras". Qualquer decisão sobre um contrato, disse ele, seria tomada pela empresa de telecomunicações local, Foroya Tele.

Para os moradores, o debate tem relação com o salmão, e não com a velocidade de download. Mais de 90% das exportações da ilha são de peixes, que incluem salmão, cavala, arenque e bacalhau. Nas águas, milhares de salmões podem ser vistos dentro de enormes gaiolas circulares flutuantes, onde são criados para serem incluídos nas refeições em Paris, Moscou, Nova York e, cada vez mais, Pequim.

Agora, a China responde por quase 7% das vendas de salmão nas Ilhas Faroe. No total, as exportações de salmão devem exceder US$ 550 milhões em 2019; uma década atrás, elas eram de cerca de US$ 190 milhões.

Em novembro, Carla Sands, embaixadora dos EUA na Dinamarca, tornou públicos os avisos contra a Huawei. Em um artigo de opinião em um jornal local das Ilhas Faroe, Sands disse que poderia haver "consequências perigosas" se a empresa pudesse construir a rede 5G.

Em dezembro, o jornal dinamarquês Berlingske publicou a transcrição de uma gravação de áudio na qual Herraduraur Joensen, consultor sênior do governo das Ilhas Faroe, disse que o embaixador chinês ameaçou prejudicar um acordo comercial se a Huawei não fosse usada para a rede 5G. Um porta-voz do primeiro-ministro disse que Joensen não compareceu à reunião.

Feng Tie, o embaixador chinês, escreveu ao Berlingske que seu país não pressionava as Ilhas Faroe. "Não faz parte da cultura chinesa fazer ameaças", disse ele. "Fazer ameaças é algo mais conhecido nos EUA."

Embora muitos moradores digam que as Ilhas Faroe preferem os EUA em vez da China, vários manifestaram raiva das autoridades americanas por exigirem a proibição da Huawei, que, segundo eles, ajudou a construir a rede 4G que existe hoje.

Outros temem prejudicar os laços econômicos com os chineses. "A China não é apenas um bom cliente, é uma necessidade", disse Martin Breum, especialista do Ártico que escreveu sobre as Ilhas Faroe. A população, acrescentou, “não tem mais nada para vender para o resto do mundo. Ela vive de seu pescado."

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