
A meta de reduzir 90% das emissões até 2040 promete colocar a União Europeia na vanguarda global do combate às mudanças climáticas. Mas um mecanismo embutido na proposta revela a insegurança que domina capitais europeias: uma cláusula de revisão permitirá rever – e eventualmente enfraquecer – esse compromisso a cada dois anos. O que era para ser bandeira climática vira garantia de saída.
A decisão foi formalizada durante reunião de líderes em Bruxelas, após semanas de impasse que já fizeram a UE perder o prazo de setembro para entregar suas metas climáticas de 2035 à COP30. O epicentro da hesitação não está em negacionistas do clima, mas em economias centrais como França e Alemanha, que reclamaram de “pressa” e pediram mais tempo junto com outros nove países-membros.
A Polônia lidera a resistência com argumento pragmático: a cláusula de revisão seria necessária caso tecnologias verdes não se desenvolvam conforme previsto ou condições econômicas impeçam investimentos necessários. França e Letônia adicionam outra camada de preocupação – temem que florestas e terras agrícolas tenham dificuldade para absorver CO² suficiente para cumprir a meta, em parte devido aos incêndios florestais agravados pelas próprias mudanças climáticas.
O paradoxo é evidente: o bloco que sempre se posicionou como líder climático global agora insere válvulas de escape em seus compromissos. A reavaliação será baseada em “evidências científicas recentes, avanços tecnológicos e desafios de competitividade”, este último termo sendo o real catalisador da cautela europeia.
A tensão reflete o dilema entre manter liderança ambiental e proteger indústrias que enfrentam a concorrência chinesa em tecnologias verdes. A Comissão Europeia já sinalizou concessões ao propor o enfraquecimento de algumas leis verdes, incluindo a lei de sustentabilidade corporativa e um futuro sistema de precificação de carbono para transporte e combustíveis de aquecimento.
A meta de 90% permanece tecnicamente inalterada, mas seu futuro dependerá menos de ciência climática e mais de balanços corporativos e disputas geopolíticas. O acordo político deve ser fechado na cúpula de 4 de novembro, poucos dias antes da COP30 no Brasil, onde a Europa terá de explicar por que sua ambição climática agora vem com ressalvas impressas em letras pequenas.






