
A ministra federal da Educação alemã, Karin Prien, provocou um debate acalorado ao sugerir que a Alemanha deveria considerar estabelecer cotas máximas para alunos imigrantes em escolas, limitando sua presença a 30% ou 40% por instituição. A proposta, inspirada no modelo dinamarquês, emerge num contexto de deterioração do sistema educacional alemão e crescentes tensões sociais sobre imigração.
“Uma cota máxima para alunos imigrantes nas escolas alemãs seria um modelo concebível”, afirmou Prien, primeira mulher de ascendência judaica a ocupar um cargo ministerial federal no pós-guerra. A declaração gerou reações imediatas tanto de apoiadores quanto de críticos, evidenciando as divisões profundas sobre o tema migratório na sociedade alemã.
Segundo reportagem publicada pelo jornal alemão Deutsche Welle, a proposta encontra respaldo em algumas realidades educacionais. Na escola primária dirigida por Sabine Schwarz, na Renânia do Norte-Vestfália, mais de 80% dos 350 alunos vêm de famílias imigrantes. “Isso é triste”, lamenta a diretora, referindo-se ao fato de que famílias alemãs da vizinhança preferem matricular seus filhos em outras escolas, mesmo quando a legislação permite livre escolha desde 2005.
Esse fenômeno reflete padrões socioeconômicos mais amplos. Famílias alemãs de classe média, preocupadas com as perspectivas educacionais de seus filhos, optam por instituições com menor concentração de imigrantes, criando uma segregação educacional de facto. “O que sempre se ouve é que a migração é associada a um nível mais baixo de educação”, observa Schwarz, contestando essa percepção: “Por exemplo, nos beneficiamos com a onda de refugiados em 2015 porque recebemos muitas crianças muito interessadas em educação”.
A proposta surge num momento crítico para a educação alemã. Na última pesquisa PISA de 2022, o país posicionou-se apenas no meio da tabela internacional, com competências em leitura, matemática e ciências atingindo os níveis mais baixos já registrados. Um em cada quatro alunos da quarta série tem dificuldades com leitura, segundo a pesquisa Iglu de 2023, enquanto 56 mil estudantes abandonam anualmente a escola sem qualificação.
Críticas e alternativas
O pedagogo Klaus Hurrelmann compreende a lógica da proposta: “Uma composição bem mesclada de turmas escolares claramente leva a um melhor aprendizado”. Contudo, considera sua implementação quase impossível, pois exigiria identificação da origem étnica, considerada discriminatória. “Os mal-entendidos resultantes não compensam os possíveis benefícios”, argumenta.
A Conferência Federal de Alunos criticou duramente a ideia, afirmando que “envia um sinal perigoso” e promove estigmatização. “A origem nunca deve se tornar um critério para oportunidades educacionais”, declarou a entidade, defendendo escolas como “locais de participação, não de exclusão”.
Stefan Düll, presidente da Federação Alemã de Professores, considera a proposta organizacionalmente inviável e que “apenas deslocaria o problema”, levando famílias alemãs a optarem por escolas privadas. Em sua opinião, a solução seria aumentar a proporção de professores em escolas com alta concentração de imigrantes, permitindo medidas de apoio adicionais.
A crise educacional alemã transcende a questão migratória. A escassez de 125 mil educadores infantis em pré-escolas representa um gargalo sistêmico. Como observa Schwarz, 60% das crianças chegam às escolas primárias com déficits de aprendizagem significativos, reflexo direto das deficiências nas creches e unidades de ensino infantil.
“O idioma deve ser promovido com especialistas treinados e recursos adequados. Mas isso não está acontecendo no momento”, afirma a diretora. “O trabalho na pré-escola é fundamental para o sucesso educacional”.
Investimento como saída
O programa federal Startchancen, que destinará 20 bilhões de euros para 4 mil escolas vulneráveis nos próximos anos, sugere uma abordagem mais promissora. Ao invés de redistribuir alunos, o programa foca em prover recursos onde são mais necessários, uma estratégia que especialistas consideram economicamente mais eficiente e socialmente mais justa.
A proposta de Prien, embora compreensível diante das pressões políticas e das desigualdades educacionais, representa uma resposta sintomática a problemas estruturais profundos. A Alemanha, que necessita urgentemente formar novas gerações de trabalhadores qualificados para enfrentar o envelhecimento populacional e preservar sua competitividade global, encontra-se diante de um dilema: reforçar políticas que podem ampliar divisões sociais ou investir em soluções estruturantes que fortaleçam a coesão nacional por meio de uma educação verdadeiramente inclusiva e de qualidade.